Peça fundamental no Carnaval de Salvador, trios elétricos têm investimento milionário para rodar na folia; conheça bastidores
Foto: Divulgação/ Barretão
"Eu fui atrás de um caminhão, fazer meu carnaval, e o carnaval é feito no coração...". Clori Roger escreveu, Chiclete com Banana cantou e o resto é história. O mote do Carnaval de Salvador é esse, ir atrás do caminhão, seja com abadá e dentro das cordas, ou como um folião pipoca. O importante é não perder a fé nem deixar o Carnaval passar.
Símbolo da maior festa de rua do mundo, o trio elétrico antes de ser trio era um Ford Modelo T (1929), que em 1951 era utilizado por Osmar Macedo e Dodô para circular pela capital baiana tocando frevo. A Fobica Elétrica se transformou em trio após Temistócles Aragão se unir a dupla na aventura.
Foto: Arquivo
Foi a inteligência e a ousadia de Dodô e Osmar, técnico em eletrônica e dono de uma empresa de metalurgia, respectivamente, que o veículo evoluiu, saindo de um Ford Modelo T para uma pick-up Ford F-1000, até que outros empresários perceberam na máquina, uma forma de trasnformar o Carnaval, como o trio elétrico Tapajós, que foi a primeira carroceria elétrica, com estrutura de chapa metálica e madeira, lançada em 1962.
Orlando Campos, criador do trio Tapajós, foi também o responsável pela Caetanave, que desfilou em Salvador em 1973, em comemoração ao exílio de Caetano Veloso e Gilberto Gil. Em 1981, os blocos passaram a aderir ao trio elétrico como veículo oficial da folia.
Foto: Secom
Setenta e quatro anos depois da criação do trio elétrico, o Carnaval de Salvador conta com aproximadamente 500 equipamentos, entre trios e mini trios, de acordo com um levantamento feito pelo presidente da Associação de Blocos e Trios, Washington Paganelli, que também é presidente do Conselho Municipal do Carnaval e Outras Festas Populares (Comcar).
"VAMOS DECOLAR NESSE AVIÃO, SENTIR O FOGO DO DRAGÃO NO MAIOR TRIO DO PLANETA"
Alguns desses são conhecidos por sua grandeza e pelas estrelas, que anualmente desfilam com a máquina na avenida. É o caso do Trio Dragão, que já foi cantado em música por Durval Lélys, e pertence a Irmão, como gosta de ser identificado, de 50 anos, que trabalha há 34 anos na folia.
Foto: Lucas Moura/ Secom
Em entrevista ao Bahia Notícias, o atual proprietário do trio, falou sobre a magnitude do equipamento, que é considerado o maior trio do mundo desde a sua criação em 2005. Irmão contou que foi convencido por Durval em 2019 a investir no veículo.
"Fiz uma mega reforma. O Dragão já era grande, e eu consegui ampliar. Eram 32 metros, eu aumentei 4 metros de comprimento, eram 4,20m, eu botei para 5,20m largura. A capacidade de público em cima era para cem pessoas, hoje a capacidade de convidados é para duzentas. Embaixo hoje tem quatro banheiros femininos climatizados com ar condicionado, cinco banheiros masculinos. O Dragão tem dois geradores com a capacidade de iluminar uma cidade pequena com, sei lá, uns cinco mil habitantes. Ele é realmente o maior trio do planeta."
Foto: Arquivo Pessoal
Irmão também é um dos responsáveis pelo Trio Joia, que vai para o terceiro ano tendo Bell Marques como principal estrela. “O pessoal de Léo Santana tocava comigo, eles faziam Carnaval em outro trio. E o pessoal foi vendo que o carro estava melhorando, foi criando o interesse de outros artistas, e aí o pessoal de Bell fez uma proposta para a gente rodar o país inteiro e o Carnaval com ele. Hoje a prioridade do trio Joia é de Bell, a não ser que a gente esteja em um lugar muito distante e não dê para chegar”, contou.
"TELEGUIADOS PELO SOM DO TRIO"
Seja de Dodô, Osmar, Ivete, Brown, Durval ou Bell. Para estar na avenida, um dos princípios básicos de um trio elétrico é que o som seja bom. E Irmão conta que para o ex-Chicleteiro desfilar com o Joia na avenida pelo 2º ano, foi necessário um alto investimento.
"Nós fizemos um investimento de mais de R$ 2,5 milhões. O que a gente fez é a exigência dele. Ele tocou o primeiro ano normal, no segundo ano, nós precisamos agora dar um up aqui em termos de equipamento de som, de áudio então, botamos tudo que há de melhor de áudio no país. Nós temos os melhores amplificadores, as melhores mesas. É um investimento muito alto para o retorno a longo prazo. Um investimento desse aí no mínimo é em 3 anos pra se recuperar."
Foto: Lucas Moura/ Secom
Cada equipamento para um trio elétrico chega a custar R$ 1 milhão. Para José Barreto, de 64 anos, dono dos trios Barretão, que está há mais de 20 anos no mercado, é necessário um alto investimento para colocar um produto de qualidade nas ruas. O empresário, no entanto, não fala em cifras.
"O investimento é muito alto. Nós temos equipamento no trio de ponta. Ramificadores importados, bons alto-falantes. É até perigoso isso para gente porque o nosso trio viaja o Brasil todo na estrada. Mas hoje, um artista de ponta que quer se apresentar bem precisa de equipamentos bons para você ter aquela voz. Tem trios que você consegue botar a voz do artista com toda a nitidez possível. Tem por trás de tudo aquilo ali um equipamento de ponta que proporciona isso. Então, acho que o trio elétrico, pelo que representa hoje para a história do Carnaval da Bahia, do Brasil, é uma das figuras mais importantes da festa.”
"EU VOU, ATRÁS DO TRIO ELÉTRICO VOU, DANÇAR AO NEGRO TOQUE DO AGOGÔ, CURTINDO A MINHA BAIANIDADE NAGÔ"
Com dois trios correndo o Carnaval de Salvador, o Barretão irá desfilar na avenida levando as bandas Papazzoni, Cheiro de Amor, Tomate e Filhos de Jorge, Saulo e Xanddy Harmonia.
Ao BN, Barreto contou que foi uma escolha da equipe estar com os parceiros mais antigos no Carnaval de 2025 e fazer uma festa bonita em Salvador, ao invés de tentar rodar todo o país em micaretas.
Foto: Barretão
"Nós temos dois trios elétricos, o Barretão 1, que é o mais antigo, que nós reformamos todo ele para o Carnaval. O trio hoje tem uma estrutura, que proporciona para o artista um conforto diferenciado. Temos quatro banheiros no trio, temos dois camarins, um para o artista, outro para a banda. Meu trio, tem uma sala VIP para convidados. Nós temos um dos melhores equipamentos do mercado e esse ano a gente fez opção pelos parceiros mais antigos, que prestigiam a gente o ano todo."
"O SOM DO TRIO ELÉTRICO DE OSMAR E DE DODÔ"
A associação do trio elétrico ao artista que desfila nele se tornou algo comum. Quem não lembra de Ivete Sangalo desfilando com o Trio Demolidor? Ou o próprio Durval com o Dragão, Carlinhos Brown e o Camarote Andante?
Alguns diriam que "no tempo das vacas gordas" cada artista tinha seu próprio trio, mas a desistência de ter um equipamento só seu não veio por falta de dinheiro para investir, e sim, por não enxergar viável ter um veículo para ser usado apenas em fevereiro.
"O Chiclete fazia dez eventos no ano. Imagine dez eventos, com o trio exclusivo seu? Você tinha um gasto absurdo para ir para o Fortal, fazer um dia e voltar. Hoje, um exemplo, eu vou pro Fortal, faço quatro dias com Bell, pronto. Mas se não fosse Bell, os quatro dias, eu ia fazer um dia com o Léo, um dia com Cláudia, um dia com Ivete um dia com Anitta. Não é viável hoje o artista ter um trio elétrico, porque o outro artista não quer tocar no trio dele", conta Irmão.
Foto: Lucas Moura/ Secom
Atualmente, as pessoas conhecem o Trio Dragão como o Trio de Durval, o que para o proprietário não é um problema. "Não vai mudar nada, o dinheiro é o mesmo", diz o empresário.
Para Barreto, seria importante o reconhecimento do equipamento na avenida. Ao BN, o empresário falou sobre a possibilidade da criação de um prêmio para os trios elétricos que desfilam no Carnaval de Salvador.
"Todo mundo quer estar em cima de um trio no Carnaval da Bahia. Eu tenho trio elétrico porque eu gosto, mas falta um reconhecimento pelo nosso equipamento. É um instrumento essencial para o Carnaval. Sem ele você não conseguiria fazer, é o instrumento que transformou o que é o Carnaval hoje."
"EI, VOCÊ AÍ, ME DÁ UM DINHEIRO AÍ"
E o mercado dos trios elétricos é rentavel? Quem vê uma máquina na rua imagina que o dinheiro é bom, afinal, um equipamento daqueles não sairia de graça ou por pouco dinheiro em pleno Carnaval de Salvador, festa que movimenta bilhões na economia baiana, correto?
Porém, o cenário é um pouco diferente do imaginado. De acordo com a apuração feita pelo Bahia Notícias, o aluguel de um trio elétrico para a festa pode variar de R$ 70 mil a R$ 500 mil, a depender da qualidade da máquina e do estilo, trio, mini trio ou pranchão.
"Eu tenho muita paixão por isso eu tenho um prazer imenso de ter um trio elétrico, é um negócio que dá prazer para mim, mas é um projeto pessoal", conta Barreto.
Foto: Barretão
Ao BN, Irmão conta que o valor que se ganha no Carnaval de Salvador é bom, mas se trata de um investimento a longo prazo. Em comparação ao valor das micaretas, a capital baiana é a que mais dá lucro.
"Eu faço uma micareta de quatro dias que eu não consigo alcançar 25% do valor do Carnaval de Salvador. Uma comparação do Carnaval de Salvador e o Fortal. O Carnaval de Salvador é seis dias. O Fortal é quatro. Se eu botar na balança, 20% é o valor do Carnaval de Salvador, eu faço o Fortal. Em termos de valores, 80% é mais barato. Entende? É desproporcional demais. O ideal para quem trabalha com trio elétrico era que tivesse dois Carnavais."
"ATRÁS DO TRIO ELÉTRICO SÓ NÃO VAI QUEM JÁ MORREU"
Para o ano de 2025, o Carnaval de Salvador passará por mudanças nas ruas, visando uma melhoria no conforto dos foliões e de quem puxa o trio na festa.
Em entrevista ao Bahia Notícias no final de 2024, o presidente da Empresa Salvador Turismo (Saltur), Isaac Edington, revelou que para este ano a organização da festa será desafiadora devido ao número de equipamentos e aos transtornos vividos no ano passado, com trios quebrados, engarrafamentos e a lotação do circuito.
"É importante lembrar que não é uma falha do artista. É obrigação do contratante entregar o serviço bom. Eu já estou aqui no galpão com a equipe toda de manutenção, tudo em dia. Infelizmente pode ocorrer um problema? Pode. Mas a precaução foi feita", diz Irmão que não faz vista grossa para a fiscalização.
Foto: Valter Pontes/ Secom
De acordo com Washington Paganelli, presidente do Conselho Municipal do Carnaval (Comcar), o Circuito Dodô (Barra-Ondina), será mais afetado com a redução e com o fim do estacionamento na Graça.
"Para você ter uma ideia, no ano passado nós tivemos 44 equipamentos na Barra, entre trios e carro de apoio. Esse ano nós vamos ter 24. Essa redução é justamente para ter mais conforto para o folião e para o trio elétrico também, mas também porque a gente não tem mais espaço. Quando sai da Barra, 15 horas, 16 horas, eu já tenho que estar com toda a fila lá arrumada. E eu só tenho espaço no Porto da Barra até o Farol para 24 equipamentos", afirmou.
O Carnaval de Salvador tem mais de 30 blocos confirmados para a folia em 2025. Os trios Dragão, Joia e o Barretão 1 e 2 estarão na festa.
Fonte: Bahia Noticias
Redação : Altamirando de Lima, Radialista DRT 5842 Tel (75) 981761290
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