Número de mulheres baleadas em agosto bate recorde

 

Segundo o Instituto Fogo Cruzado, agosto registrou maior número de mulheres alvejadas por armas de fogo

  • Yasmin Oliveira

Salvador
Publicado em 07/09/2023 às 05:30:54

Mãe Bernadete. Crédito: Reprodução


A violência armada contra mulheres subiu durante agosto. De acordo com dados do Instituto Fogo Cruzado, o mês registrou maior número de mulheres baleadas, feridas e mortas, por armas de fogo em Salvador e Região Metropolitana, desde que iniciaram as atividades no estado, em julho de 2022.

Entre os números coletados pelo Instituto, que produz e divulga dados abertos e colaborativos sobre violência armada, 27 mulheres foram vítimas da violência armada: 18 foram mortas e nove feridas. Segundo a Secretaria de Segurança Pública, entre janeiro e setembro, houve 62 casos de feminicídio, uma redução de 12,9%, em relação ao mesmo período no ano anterior (71).

“A violência contra mulher é sempre um dado muito importante para ser analisado porque o número só tende a crescer no Brasil. Nos deparamos com números que vão apontar mulheres sendo mortas porque vêm sofrendo uma violência sistêmica, de forma muito sutil e subjetiva” conta a especialista em segurança pública, Larissa Neves. “Essas mulheres não podem mais ser tratadas como apenas números”.

Das vítimas de arma de fogo do mês anterior, 165 eram homens (139 mortos e 26 feridos) e 12 eram mulheres (sete foram mortas e cinco feridas) e oito não tiveram o gênero identificado (três mortos e cinco feridos).

Desgosto

Dentre os casos mais marcantes está o assassinato de Bernadete Pacífico (72), no Quilombo Pitanga dos Palmares, município de Simões Filho, na noite de 17 de agosto. Mãe Bernadete, como era conhecida, foi uma líder quilombola baiana e coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq).

“Mãe Bernadete veio sofrendo uma dinâmica de ameaças. Ela teve o filho, também quilombola, morto há seis anos e essa história se repete na Bahia, a partir do momento que temos muitas lideranças, muitas pessoas de comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas, que precisam ser protegidas porque estão mediante a ameaças” disse Larissa Neves.

Em Tancredo Neves ocorreu outro caso notório no dia 15 de agosto. Paloma Assis foi morta após deixar os filhos na escola. A investigação resultou em quatro pessoas presas. Segundo a Polícia Civil, a amante do marido da vítima foi quem planejou o crime. Duas prisões aconteceram na sexta (25) e outras duas nesta terça (5).

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Bairros mais afetados pela violência armada:

Alto do Cabrito (Salvador): 1 ferida;

Balneário (Dias D’Ávila): 1 morta;

Beiru/Tancredo Neves (Salvador): 1 morta;

Cajazeiras VIII (Salvador): 2 mortas;

Cosme de Farias (Salvador): 2 mortas;

Coutos (Salvador): 1 morta e 2 feridas;

Federação (Salvador): 1 ferida;

IAPI (Salvador): 1 ferida;

Jardim Brasília (Camaçari): 1 morta;

JK (Mata de São João): 3 mortas;

NI (Camaçari): 1 morta;

Periperi (Salvador): 2 mortas;

Pitanga de Palmares (Simões Filho): 1 morta;

Rio Vermelho (Salvador): 1 ferida;

São Cristóvão (Salvador): 1 ferida;

São Marcos (Salvador): 2 mortas e 1 feridas;

Valéria (Salvador): 1 morta;

Dados: Instituto Fogo Cruzado

SSP

“A Secretaria da Segurança Pública informa que, de janeiro a agosto de 2023, os assassinatos recuaram 3,3% no estado, representando a preservação de 112 vidas. Em Salvador, a redução ficou em 11%. Informa ainda que os feminicídios estão com diminuição de 12,9% na Bahia, no mesmo período. Ressalta também que as mortes violentas apresentaram queda de 22,5% na Bahia, entre 2016 e 2022. A SSP enfatiza ainda que ações policiais este ano alcançaram o dobro de fuzis apreendidos em todo o ano de 2022. Até a primeira semana de setembro, as forças estaduais apreenderam 44 fuzis em operações contra o crime organizado. Por fim, a SSP salienta que os investimentos em concursos, equipamentos, capacitação, tecnologia e novas estruturas têm como objetivo ampliar a redução das mortes e a preservação da vida.”

Sobre o assunto, a Polícia Civil emitiu o seguinte posicionamento: “Visto que a Polícia Civil não comenta dados não oficiais, o prazo solicitado para a resposta é incompatível com o tempo necessário para o devido levantamento junto ao Instituto de Segurança Pública, Estatística e Pesquisa Criminal (Ispe), órgão oficial de estatísticas da Instituição.”

A Polícia Militar foi procurada para dar um posicionamento, mas não houve resposta.

Mulheres negras são maioria entre os dados

Dentre os dados disponibilizados pelo Instituto Fogo Cruzado, chama a atenção o número de mulheres negras dentro do universo de 27 mulheres baleadas, durante o mês de agosto. No total, 16 mulheres negras foram vitimadas, 15 foram mortas e uma foi ferida, 10 mulheres não tiveram a identificação de etnia e cor, duas mortas e oito feridas e uma mulher branca foi morta.

Para a especialista de segurança Larissa Neves, este número está atrelado à naturalização da violência racial no Brasil e refletem que pouco se entende sobre a vida das mulheres negras, pois estamos diante de um racismo que violenta os corpos das pessoas negras desde a infância. Ao observar que os casos marcantes de agosto foram mulheres negras, é fácil perceber que estas vítimas estão numa dinâmica de orientação das suas famílias ou estão na frente de movimentos e, muitas vezes, essa violência é causada por um elemento importante: o fator racial.

“É olhar para mulheres que, muitas vezes, não são humanizadas, nem vistas como mulheres, que estão e são numa dinâmica de orientação das suas famílias. A maioria dos casos de violência contra mulher, quando acontece feminicídio, está muito atrelado à uma dinâmica de relacionamento íntimo e outras dinâmicas também, por exemplo, mulheres que são mortas no seu local de trabalho, mulheres que simplesmente estão em um local e são baleadas”, explica Larissa Neves


Fonte Correio

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